segunda-feira, 10 de março de 2008

Entrevista da Primeira Dama da Equipe Brasa Michele Nicolini


Quem conhece a habilidade de Michelle Nicolini como lutadora se impressiona com sua feminilidade e calma ao falar. Nesta entrevista, a campeã do Mundial de Jiu Jitsu 2007 conta um pouco sobre sua carreira e conquistas. (Por: Marcelo Fontana)

Marcelo Fontana: Michelle, qual é a sensação por ter conquistado o Mundial?
Michellle Nicolini: O Mundial é a maior conquista de um lutador de pano. Este ano queria muito vencer.

Marcelo Fontana: Como foi sua campanha?
Michellle Nicolini: No início deste ano tive duas derrotas: na final da seletiva do ADCC e no Brasileiro da CBJJ. Meu psicológico estava abalado, então me dediquei somente aos treinos - Jiu Jitsu e preparação física. Estava treinando diariamente, treinei em muitos domingos inclusive. O Demian Maia abriu espaço na academia dele, então ia treinar com o Robert em São Paulo, onde o pessoal é mais competidor.

Marcelo Fontana: Alguma luta em especial a marcou?
Michellle Nicolini: Ah sim... neste Mundial foi a primeira vez em que as mulheres tiveram a oportunidade de disputar o absoluto. No absoluto o bicho pega. As meninas estão com o nível muito bom, tinham algumas finalistas do ADCC inscritas. Fui bem desencanada no absoluto. Achei que minha luta mais dura foi com a Penny Thomas (Ryan Gracie). Foi minha primeira luta do campeonato, estava naquele nervosismo e meu corpo não estava bem aquecido também. Senti um pouco. O pessoal estava me orientando quanto ao tempo, e deu tudo certo.

Marcelo Fontana: Você possui uma coleção invejável de títulos. Qual é o próximo passo agora?
Michellle Nicolini: É, muita gente me pergunta se penso em ir para o MMA, mas eu insisto que não. Há um tempo atrás até apareceu uma luta, mas não deu certo. Aí desencanei. Gosto mesmo é do Jiu Jitsu.

Marcelo Fontana: Quais são as diferenças entre os torneios masculinos e os femininos?
Michellle Nicolini: Adoro perguntas assim porque gosto de deixar bem claro que sofremos discriminações, e até hoje ninguém me fez entender o porquê de tais diferenças. Os prêmios para homens são sempre mais altos. Há campeonatos que não têm categoria feminina. Outros, por exemplo, têm categoria absoluta valendo grana, mas não feminina. Tempo de luta, regras e pontuação são iguais. Por que somos “café com leite” algumas vezes e em outras não?!

Marcelo Fontana: Sofre algum preconceito no seu dia-a-dia por ser mulher e lutadora?
Michellle Nicolini: Não, hoje em dia o pessoal me respeita dentro e fora dos tatamis. Já ouvi comentários que me deixaram triste, mas aprendi a superá-los.

Marcelo Fontana: Afinal, como você chegou ao Jiu Jitsu?
Michellle Nicolini: Em 2000 parei de treinar capoeira porque o professor mudou de cidade. Tentei treinar com outro, mas não gostei. Queria fazer outra luta. Foi no início do meu namoro com o Robert Drysdale. Ele morava em Las Vegas e a gente namorava pela Internet. Comentei com ele que ia procurar Judô e ele deu a dica: “ vá fazer uma aula de Jiu Jitsu porque tem fundamentos de Judô, além de toda parte de chão. E é mais dinâmica”. Fui e acabei gostando. Com um mês de treino já estava no torneio interno da academia. Mas perdi os três primeiros campeonatos em que participei e já estava ficando traumatizada. Quando ele voltou ao Brasil, porém, passei a treinar com ele e, assim, aprendi tudo o que sei hoje.

Marcelo Fontana: O Jiu Jitsu é sua única atividade profissional?
Michellle Nicolini: É minha maior prioridade. Comecei a fazer faculdade há uns três anos, mas resolvi parar porque não conseguia me dedicar como deveria ao treinamento, trabalho e estudo. Hoje trabalho quatro horas por dia, de segunda a sexta, administrando a academia do Robert. No resto do tempo me dedico aos treinos e ao lazer também, porque não sou de ferro.

Marcelo Fontana: Quais são as perspectivas para o esporte de luta no país, em sua opinião?
Michellle Nicolini: Acho que, infelizmente, nosso país não valoriza o atleta em geral. E menos ainda quando o esporte não é olímpico. Lutadores são grandes ídolos em outros países, e aqui ainda são vistos pela sociedade como briguentos. Tem gente lutando por muito pouco aqui, enquanto lá fora os valores são bem diferentes. O esporte precisa que a sociedade deixe de ter preconceitos. Penso que, ao conquistarmos a sociedade, teremos muito mais adeptos, praticantes, colaboradores e maior público pedindo eventos de grande nível. Gostaria que fizessem algo para profissionalizar o Jiu Jitsu, por exemplo.

Marcelo Fontana: E a dinâmica com Robert Drysdale? A cobrança é maior por conta do relacionamento entre vocês?
Michellle Nicolini: Às vezes penso que sim, mas ele diz que não. É que, por ser competidora, preciso ser mais cobrada. Num dia de TPM, hahahahaha, isso vira um problema. Ele é um ótimo professor, conhece meus defeitos e, após um campeonato, dificilmente elogia: primeiro chama minha atenção para meus erros e depois, se ganhei, elogia. Não gosto de ouvir alguém me dizer “ ah, tá bom” quando perdi. E o Robert é um excelente técnico e professor. Ele também é muito atencioso e paciente comigo.


Marcelo Fontana: O que mudaria em sua carreira se pudesse voltar no tempo?
Michellle Nicolini: O ano de 2004. Eu e o Robert estávamos separados, e acho que isso mexeu com os dois. Não tivemos bons resultados. Não fui em quase nenhum campeonato. Não parei de treinar, mas diminuí o ritmo. O psicológico não estava legal. Acho que, se pudesse, não teria perdido um ano de competições.


Marcelo Fontana: Quais são suas recomendações para quem deseja seguir uma carreira de sucesso no Jiu Jitsu?
Michellle Nicolini: Eu digo para não se enganar, porque o esporte ainda não tem o reconhecimento que merece. Mas se depois de algumas aulas você sentir que gosta, caia de cabeça. Entre pra valer, torne-se um competidor(a). Seus esforços serão recompensados. Muitas vezes uma conquista como o Mundial de Jiu Jitsu, por exemplo, deve ser comparada com a sensação de um alpinista que chega no pico do Everest: quando chegamos lá, pensamos que alcançamos o que muitos gostariam. Todos nós temos algo a conquistar na vida.
(EXTRAIDO DO SITE ALL TV)

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